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A desigualdade de tratamento entre os principais candidatos

É preciso prestar atenção à diferenciação de tratamento que a mídia dá em relação aos candidatos. Embora o Jornal Folha de S. Paulo tenha recentemente publicado denúncias em relação aos candidatos Aécio Neves e Eduardo Campos, a grande mídia conteve-se na repercussão da matéria, tratando, inclusive, de fazer a defesa deles.

Para Jakson Ferreira, na campanha de 2010, em relação à candidatura de José Serra “não houve nada que se assemelhasse à cobertura negativa empreendida contra a campanha de Dilma Rousseff”, tendo sido ocultados “muitos temas relevantes que podiam ter impactado a candidatura de José Serra”.

Segundo ele, “esporadicamente, aparecia alguma notícia que se poderia classificar como negativa para ele, de baixa relevância, escondida no meio do caderno especial do jornal para as eleições; apenas para dar alguma aparência de imparcialidade que o jornal afirma ter”.

Por exemplo, “houve benevolência na imprensa com relação ao nepotismo nos mandatos de Serra”. Embora a revista Carta Capital tenha publicado matéria “sobre empresa da filha de José Serra que, segundo informava, intermediava contratos de empresas estrangeiras com o governo brasileiro quando seu pai era ministro da Saúde”, ela “não teve repercussão alguma na imprensa hegemônica; tratamento muito diferente dado à matéria de Veja sobre o filho de Erenice, que teve repercussão ampla em toda a imprensa”, embora o caso da filha de Serra envolvesse “nepotismo, suspeitas em contratos governamentais sem licitação, que eram as mesmas feitas à ex-assessora de Dilma”.

As diversas informações que circularam na blogosfera, da mesma forma não repercutiram “na Folha e na imprensa em geral, com exceção da revista Carta Capital. Trata-se de contratos de altas somas com empresas de mídia para a compra de jornais e revistas para escolas”[1].

No escândalo envolvendo o filho da então ministra da Casa Civil, Erenice Guerra, Israel Guerra, desde o início, as manchetes substituíram “o nome da ministra, pouco conhecida na função, por ‘braço direito de Dilma’”[2].

Mais tarde, vieram as manchetes de queda de vantagem de Dilma nas pesquisas, tratando-se as acusações relativas a Erenice Guerra “como se fossem fatos indubitáveis, comprovados” e  fazendo com que, às vésperas da eleição, boa parte dos eleitores tivesse “ideias difusas, alimentadas pelos escândalos, segundo as quais havia grossa corrupção na Casa Civil, relacionada a Dilma Rousseff.

Ao mesmo tempo, nas pesquisas constatava-se “a tendência de subida de Marina, retirando pontos de Dilma, como efeito dos escândalos”, atraindo “maior interesse por Marina Silva”, que era considerada “como alternativa acima do bem e do mal, pois, além de julgar os erros do PT”, tratava “das falhas dos tucanos”.

O que estava em jogo, contudo, era a possibilidades de Marina Silva “conquistar votos, sem ameaçar a segunda posição de José Serra, favorecendo-o, ao levar a eleição para o segundo turno”.

De acordo com Jakson Ferreira de Alencar, “havia dobradinha também entre mídia impressa e eletrônica e entre estas e o programa eleitoral de José Serra na TV. As manchetes sobre os escândalos saiam pela manhã nos jornais, principalmente na Folha, em O Globo e O Estado de S. Paulo, e, à noite, as mais fortes já estavam no programa de Serra e eram repercutidas no Jornal Nacional, da Rede Globo, ampliando assim a informação ao público, já que no país poucos leem jornal”.

Conclusão

Foi a blogosfera progressista que se constituiu “em permanente contraponto às informações da Folha e dos outros órgãos da imprensa hegemônica”, lembrando que, “para blogueiros e analistas que acompanharam a evolução das pesquisas de diversos institutos, o Datafolha teria aproveitado o início dos programas eleitorais na televisão para ajustar seus números aos dos outros institutos de pesquisa, antes que as urnas os desmentissem. Para tais analistas, ao longo da campanha até aquele momento, o Datafolha teria publicado números que visavam manter o ânimo e as contribuições financeiras para a campanha de José Serra”.

Jakson Ferreira de Alencar acentua que “não se pode dizer que a web e a blogosfera sejam a redenção da comunicação brasileira, mas elas têm dado uma importante contribuição, com consistência, no espectro de informação do país, ampliando a diversidade e fornecendo contrapontos para a mudança da maneira de se formar a opinião pública” e “fazendo apurações e esclarecimentos” que faltam à mídia hegemônica.

Mesmo com todo o esforço da grande mídia e com a “avalanche de escândalos e factoides”, ela não conseguiu eleger o candidato de sua preferência. Todavia, embora a atuação da mídia não tenha definido a eleição, pois os políticos adversários venceram as três últimas, ela tem, como conclui Jakson Ferreira, alterado os rumos da campanha, definido a agenda de temas discutidos durante a campanha, focada sobretudo em escândalos e factoides contra os políticos adversários. Não se pode negar, contudo, o peso de sua influência “nas intenções de voto e nos resultados finais”, pois, se ela não faz a cabeça do eleitor, ela “ajuda a criar e reforçar tendências e tem um peso significativo nas decisões dele, particularmente em relação aos neutros, ou na intenção de voto pouco convicta”. Requer, por isso, toda a atenção dos eleitores.

Florianópolis, 28 de julho de 2014.


Oswaldo Miqueluzzi – Advogado, licenciado em História com pós-graduação em História Contemporânea. Ex-vice-presidente da ABRAT (Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas) – Região Sul. Assessor jurídico da Federação dos Trabalhadores no Comércio no Estado de Santa Catarina.

* Estudo elaborado com base na obra “A ditadura continuada: fatos, factoides e partidarismo da imprensa na eleição de Dilma Rousseff”, de Jakson Ferreira de Alencar. São Paulo: Paulus, 2012. As citações aqui feitas são extraídas desta obra.



[1] Desde 2004, especialmente de 2007/2008 em diante, Abril, Folha, Estadão, Globo/Fundação Roberto Marinho, receberam da “FDE [Fundação Desenvolvimento da Educação do governo do Estado de São Paulo] no mínimo R$ 250 milhões (R$ 248.653.370,27)” [valores não corrigidos]. “As vendas maciças desse papelório à FDE coincidem com o apoio crescente da mídia à candidatura José Serra e apoio ao PSDB”.

[2] “Em meados de 2012 a Justiça arquivou as investigações contra Erenice por falta de provas. O fato não foi divulgado pela imprensa. As poucas notas a respeito foram de baixíssima visibilidade. Passadas as eleições, o interesse da imprensa por ela e pelos supostos escândalos da Casa Civil cessou”.

Autor: Oswaldo Miqueluzzi

Publicado em 12/08/2014 -

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