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FECESC 3o Encontro Nacional pelo Direito a Comunicacao

Os fantasmas dos anos de chumbo da ditadura militar no Brasil, período de 1964 a 1985, assombram a liberdade civil nesses tempos de golpe. Os estragos do atual contexto político brasileiro, de opiniões polarizadas e de retirada de direitos recaem sobre aqueles que lutam, de alguma forma, por uma sociedade mais justa. Tem sido cada vez mais frequente a repressão aos movimentos sociais, ao movimento sindical e, principalmente, aos profissionais de comunicação. Seja por meio do trabalho com a obrigação de seguir as linhas editoriais conservadoras e que atendem aos interesses do capital em veículos de comunicação tradicionais ou no trabalho de campo, quando o jornalista está em exercício de sua profissão, cobrindo acontecimentos como as manifestações contra o governo ilegítimo de Michel Temer.

Jornalistas, repórteres, fotógrafos têm sido hostilizados e até agredidos pelas polícias, por registrarem os fatos, mostrarem o que realmente acontece. E não somente os profissionais da imprensa progressistas. Até mesmo aqueles de conglomerados como a Globo têm sido vítimas da violência policial, caso de André Coelho, repórter fotográfico que registrou a repressão desmedida da PM do Distrito Federal durante a marcha #OcupaBrasília no dia 24 de maio, e foi chutado por um policial. As imagens divulgadas mostram o policial atirando ao chão, próximo aos pés de André, quando esse mesmo policial fora flagrado atirando contra manifestantes. E as balas não eram de borracha.

A abertura do 3º Encontro Nacional pelo Direito à Comunicação (3ENDC) abordou o tema ao fazer uma denúncia sobre o que se pode considerar “Estado de Exceção”. Cinco vítimas da violência do Estado, da polícia e de algum tipo de censura falaram a uma plateia de aproximadamente 600 pessoas, na sexta (26). O ato foi realizado no auditório da Universidade Nacional de Brasília (UnB). O golpe em curso atinge diretamente aqueles que fazem comunicação.

Com o olho inchado, hematomas pelo corpo e curativos escondendo os dezesseis pontos que levou na região dos olhos, Vitor Guimarães, militante do Movimento dos Trabalhadores sem Teto (MTST) e da frente Povo Sem Medo foi o primeiro a falar. Uma bomba lançada pela Polícia Militar do DF, durante a ´marcha “Ocupa Brasília”, explodiu em seu rosto. “Desde aquela hora tenho entendido o objetivo deles, contra os movimentos sociais. Nos atingiram para nos calar. Hoje, somente dois dias depois, eu fiz questão de vir aqui e no próximo ato, vou fazer questão de ir de novo. Não vão nos calar”, declarou.

Por ordem de Marcelo Crivella (PRB), prefeito do Rio de Janeiro, o jornalista Caio Barbosa foi demitido do Jornal o Dia por conta de uma reportagem que denunciava o mau funcionamento dos postos de saúde da cidade. Para ele, “foi um ato de covardia. Não só demitiu como dificultou os pagamentos de direitos trabalhistas. E tudo por causa da minha opção ideológica (de esquerda) ”. O jornalista ainda falou que é seguido por policiais, de maneira secreta. Sobre a suposta presença, Caio brincou: “Um boa noite e um beijo pra você, se estiver aqui”.

A historiadora, blogueira e assessora da secretaria de formação da CUT, Conceição Oliveira (Maria Frô), contou que no mesmo momento em que relatava nas redes sociais a pressão violenta da polícia, durante a marcha em Brasília, seguidores do Deputado Jair Bolsonaro provocavam uma avalanche de comentários fascistas. Previsível, mas o que mais a deixou indignada foi um ‘ataque’ de um bombeiro do Distrito Federal que a ameaçou de morte. “Se eu estive armado, atiraria em você, só pra treinar minha mira”, dizia o post. “Eles deveriam salvar vidas. Mas esse bombeiro estava celebrando a morte e a violência”, lamentou a blogueira.

A EBC, Empresa Brasileira de Comunicação, criada para ser um veículo de comunicação público, foi o primeiro alvo do golpista Temer. O Conselho Curador da EBC tinha a função de manter a pluralidade e imparcialidade das mídias que a compõem, como Agência Brasil, Rádio Nacional, entre outras e teve seu fim decretado logo no primeiro dia após o impeachment de Dilma Rousseff. Rita Freire era presidenta do Conselho. Em seu depoimento, ela afirmou que “cassaram a representação popular em uma empresa de comunicação pública, mas não conseguiram cassar essa representação na luta por uma comunicação plural”. Ela ainda avisou que atacaram a cultura, a memória e a história e completou: “nós, que fizemos parte do Conselho, não vamos nos calar”.

Ricardo Melo, presidente afastado da EBC, falou sobre a abordagem feita para que ele deixasse o cargo. “Eliseu Quadrilha”, forma como se referiu ao Ministro da Casa Civil Eliseu Padilha, o chamou para uma conversa para definir a transição do cargo. “Muito obrigado pela atenção, Ministro, mas essa conversa só vai acontecer em 2020”. Melo foi eleito para um mandato de quatro anos, conforme determina a lei que criou a EBC. Seu mandato teve início em abril de 2016. Não adiantou recorrer. O Supremo Tribunal Federal (STF), por meio do Ministro Dias Toffoli, manteve a decisão golpista. “Viram que eu estava disposto a resistir e a partir daí, veio um saraivada de ataques, de todos os lados – pressão para eu deixar o cargo”.

Eduardo Guimarães do Blog da Cidadania teve sua casa invadida por policiais federais, após um episódio que envolveu o Juiz Sérgio Moro. O juiz prendeu em 2015, uma pessoa inocente. Guimarães representou contra o juiz no Conselho Nacional de Justiça, por abuso de poder. Dois meses depois, pinçou frases do jornalista no Twitter, que diziam respeito à foram com que o juiz estava conduzindo a Lava-Jato e o que isso representaria: acabaria com ‘seu’ emprego e com ‘sua’ vida, dirigindo-se claramente ao leitor. Mas, o juiz interpretou que aquilo fosse uma ameaça pessoal e resolveu processá-lo. Guimarães relatou momentos de terror e repressão dentro de sua casa, inclusive à sua filha, portadora de paralisia cerebral, quando Sérgio Moro decidiu saber quem era a fonte que disseram ao blogueiro sobre a antecipação de uma das fases (24ª – Aletéia) da Lava-Jato, em 2016. Confiscaram pertences como computadores, tablets e celulares, sequer dando a chance para Guimarães acionar seu advogado. “Violaram meus direitos para saber quem era minha fonte e cassaram meus seguidores por causa de posicionamentos políticos. Vamos continuar a lutar por que o nosso país precisa da gente”, reforçou o blogueiro.

O ator Sérgio Mamberti foi convidado a participar da abertura do 3º ENDC, para retratar a censura à arte. Ao lembrar os tempos da ditadura, nos quais, ele próprio fez parte de uma resistência histórica, explicou que a classe artística sempre esteve na vanguarda da luta pela democracia. Mamberti levantou o público ao classificar o governo Temer como ilegítimo. “Não é justo que a luta dos brasileiros durante todos esses anos seja jogada no lixo. Calar jamais. Temos que resistir. Não dá mais para aguentar. Temos certeza absoluta que venceremos. Já vencemos uma vez e venceremos novamente”, conclamou o ator ao exigir Diretas Já!

Podem nos prender machucar e nos matar, mas amanhã voltaremos e seremos milhões.

Morto pela violência policial, o pernambucano Edvaldo Alves, de 17 anos, foi homenageado com um minuto de silencio durante o ato. Renata Mielli, coordenadora nacional do Fórum Nacional pela Democratização (FNDC) afirmou ter visto o crescimento do discurso de ódio em meio à uma destruição de toda a luta feita pelas entidades que defendem a democratização da comunicação e a liberdade de expressão. “Com o golpe, era preciso calar as vozes dissonantes e a primeira vítima de qualquer golpe é a liberdade de expressão, seguida da liberdade manifestação. “Nós precisamos mudar o eixo da atuação política. Eles podem nos machucar, nos processar, nos ameaçar e até matar alguns de nós, mas não vão nos calar jamais. Essa é uma luta de todo o povo brasileiro”. A coordenadora anunciou a campanha “Calar Jamais”, que tem por objetivo denunciar casos de violação da liberdade.

O secretário de comunicação da CUT, Roni Anderson Barbosa, citou a marcha “Ocupa Brasília” como exemplo de imensa agressão (foram mais de 50 vítimas), de direitos de manifestação violados. E questionou: “Que democracia é essa? Queremos a democracia de volta e a comunicação é a trincheira de batalha para derrotar esse projeto ilegítimo que tenta governar o Brasil”.

André Accarini / CUT Nacional

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