25/09/2024
Por Francisco Alano (presidente da FECESC) e Maurício Mulinari (economista e assessor sindical) A disputa em torno do orçamento público tem se tornado cada vez mais um espaço que privilegia as mentiras e conchavos da elite econômica e política brasileira. A recente discussão em torno do Projeto da Lei Orçamentária Anual (PLOA) para 2025 é um exemplo vivo disso. Mais uma vez, a elite econômica e política brasileira mostra sua verdadeira cara: arrocho contra o povo trabalhador e bilhões de reais para os já bilionários membros da burguesia. O fato ocorre porque a proposta do governo na PLOA, que prevê um pequeno déficit primário de até 0,25% do PIB, tem causado escândalo entre os representantes do mercado financeiro e da grande mídia. Não satisfeitos com as amarras impostas pelo “Novo Arcabouço Fiscal”, os rentistas alardeiam que a meta é irrealista e o resultado será pior do que o projetado pelo governo. Em editorial recente, a Folha de São Paulo deixou nítida a sua posição, que faz eco à dos grandes bancos, sobre como contornar o problema: “Não haverá saída sem um programa amplo de controle de despesas. […] Despesas com Previdência e outros benefícios sobem com reajustes do salário-mínimo acima da inflação. Aportes em saúde e educação são percentuais da receita, em desalinho à dinâmica que se busca com o ajuste orçamentário. Rever tais regras será inescapável num futuro próximo, tendo em vista o esgotamento do espaço para ainda mais impostos”. O Ministério da Fazenda, embora aposte mais no aumento das receitas, não deixou de acenar positivamente a essa visão, sinalizando que fará um “pente-fino na Previdência e no BPC [Benefício de Prestação Continuada]”. Seriam esses mesmo os grandes problemas do orçamento púbico? O aumento do BPC é visto como problema, mas nada se diz sobre as polpudas renúncias fiscais que comem as receitas da seguridade social. Há mais de uma década um conjunto de grandes empresas do agronegócio e de indústrias obsoletas praticamente não contribuem com o INSS. De acordo com dados do Tesouro Nacional, a política de desoneração da folha de pagamento já resultou em uma renúncia de cerca de R$ 8 bilhões somente neste ano, quase o dobro do mesmo período de 2023. Além disso, a culpabilização do aumento do salário-mínimo desconsidera os efeitos positivos da distribuição de renda em favor das camadas mais pobres. O aumento do salário-mínimo eleva a renda das famílias, com efeitos favoráveis sobre o consumo e a produção. Esse crescimento tende a gerar uma arrecadação de impostos mais do que suficiente para cobrir as transferências sociais para os mais pobres. Diferente é o caso de outras despesas que tem ganhado espaço no orçamento, como os gastos com militares e com o legislativo....26/07/2024
Por Francisco Alano (presidente da FECESC) e Maurício Mulinari (assessor sindical) As recentes eleições parlamentares europeias trouxeram à tona mudanças no panorama político do continente, com destaque para a vitória de uma coalização de esquerda na França, comandada pelo partido França Insubmissa, de Jean-Luc Mélenchon. Entretanto, ao mesmo tempo que ocorre uma vitória da esquerda na França, também crescem posições de uma direita nacionalista, tal qual o governo de Georgia Meloni na Itália e Viktor Orbán na Hungria. Sinais tão contraditórios refletem a continuidade dos desdobramentos da crise capitalista em curso desde 2008, que tem levado a um profundo descrédito de governos associados aos programas baseados na austeridade. O tradicional “centro político” europeu – que envolve tanto a centro-direita quanto a centro-esquerda – encontra-se em grande descrédito, sendo a derrota do partido de Emmanuel Macron na eleição parlamentar francesa o mais novo capítulo de tal situação. A Europa hoje é o continente mais profundamente afetado pela crise capitalista mundial que vigora desde o colapso financeiro de 2008. Esta crise, marcada por estagnação econômica, desemprego elevado e crescente desigualdade social, é resultado das contradições inerentes ao sistema capitalista. No contexto europeu, a crise social foi exacerbada por políticas de austeridade, que impuseram cortes profundos nos gastos públicos e enfraqueceram os sistemas de bem-estar social. Mais recentemente, também a Guerra da Ucrânia, produto do conflito entre a OTAN – comandada pelos Estados Unidos – e a Rússia, tem trazido impactos significativos no aumento da inflação no continente, algo que não ocorria desde a década de 60 do século passado. Os programas de austeridade e as novas leis que levaram à derrocada de direitos trabalhistas e sociais foram aplicados ostensivamente desde 2008. Promovidos e apoiados pela União Europeia e pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) como soluções para reduzir déficits e dívidas públicas dos países – que lançaram planos de trilhões de Euros para salvar o sistema financeiro – esses programas tiveram consequências devastadoras para a população de todos os países europeus. A austeridade levou ao aumento do desemprego, redução de salários e pensões, e cortes em serviços públicos essenciais como saúde e educação. Além disso, aprofundou a desigualdade e a pobreza em muitos países, o que é agravado pelo crescimento da inflação. A falha das políticas de austeridade em proporcionar uma recuperação econômica sustentável resultou no crescente descrédito dos governos que as implementaram. Muitos eleitores passaram a ver esses governos como cúmplices do sistema capitalista em crise, que privilegia os interesses do capital financeiro em detrimento das necessidades da população trabalhadora. A vitória da esquerda na França nas recentes eleições parlamentares é um reflexo direto desse cenário de crise e descontentamento. Partidos de esquerda, como a França Insubmissa liderada por Jean-Luc Mélenchon,...08/03/2024
por Francisco Alano – presidente da FECESC Ao contrário das previsões da mídia burguesa, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro fechou o ano de 2023 em considerável crescimento: 2,9%. Muitos, interessados em esconder a realidade, associaram tal crescimento apenas à expansão da atividade agropecuária, que cresceu 15,1% no ano passado. No entanto, isso é apenas parte da verdade. A outra parte é que, junto com a atividade agropecuária, o consumo das famílias foi o principal responsável pelo surpreendente resultado positivo do PIB – com crescimento de 3,1% e participação de 63% no resultado total quando analisado pela ótica da demanda. Uma grande vitória para o governo Lula em seu primeiro ano, que alterou a rota de arrocho permanente contra a vida dos trabalhadores, algo que caracterizou profundamente o Brasil desde o impeachment da presidenta Dilma em 2016. Tal crescimento do consumo das famílias tem base em duas decisões estratégicas do governo Lula. Primeiramente, o governo iniciou seu mandato retomando a política de valorização do salário mínimo, que em 2023, foi reajustado em dois momentos sucessivos. Primeiramente, logo no início de 2023, o salário mínimo saltou de R$ 1.212 para R$ 1.302. Logo na sequência, no dia 1º de maio, aumentou novamente, chegando em R$ 1.312. Com isso, o reajuste total foi de 8,2%, mais que o dobro da inflação de 2023 – que foi de 3,7%. Tal retomada dessa política de valorização impactou diretamente tanto os programas de transferência de renda – em especial os valores pagos a aposentados e pensionistas – quanto ajudou a elevar também os demais salários dos trabalhadores brasileiros que recebem acima do salário mínimo. Em segundo lugar, o governo resgatou de maneira sistemática os programas sociais abandonados pelos governos Temer e Bolsonaro. Políticas como o Bolsa Família, o Minha Casa Minha Vida e tantas outras mais, ajudaram a repassar recursos para a população mais pobre, exatamente aquela que, proporcionalmente, mais consome. Com isso, mais um motor do consumo das famílias foi acionado, significando resultado evidente para o dinamismo da economia interna. Com o consumo aquecido, a economia brasileira retomou sua trajetória de crescimento. Isso repercutiu na queda da taxa de desocupação, que caiu para 7,8%, alcançando o menor patamar do desemprego desde 2014. Esse fato, somado ao salário mínimo em crescimento, ajudou e muito nas negociações salariais dos trabalhadores, com 77% das convenções e acordos coletivos de trabalho fechando com resultados salariais acima da inflação. Essa vitória do governo deve ser amplamente comemorada. Demonstra um primeiro passo em recolocar a melhoria das condições de vida dos trabalhadores no centro das preocupações do Estado. Entretanto, se a tarefa do governo é reconstruir o Brasil, é preciso avançar ainda mais 2024. Beneficiado agora pela economia mais...28/02/2022
Por: Ivo Castanheira – Coordenador Sindical, em nome da Diretoria do DIEESE em Santa Catarina No dia 16/02 foi aprovado o Projeto de Lei Complementar (PLC) 2/2022, que reajustou os Pisos Salariais de Santa Catarina em 10,5% a partir de janeiro último. O trâmite do PL é bastante complexo: passou por três comissões, a de Constituição e Justiça, a de Finanças, e a Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público. Foi um processo difícil, acompanhado o tempo todo pelos representantes das centrais sindicais e do DIEESE. A aprovação, em dois turnos, ocorreu com 22 votos a favor e um voto contrário nos dois turnos e duas abstenções no primeiro turno de votação. A implantação dos pisos em Santa Catarina, a partir de janeiro de 2010, é, possivelmente, a mobilização mais significativa da história do movimento sindical catarinense. Existem pisos salarias em apenas cinco estados do Brasil e Santa Catarina é o único estado onde, de fato, ocorre mobilização dos sindicatos todos os anos e uma negociação para valer, de alto nível, entre patrões e empregados. Os governos, nos 12 anos de negociação dos pisos, se limitaram democraticamente a acatar a decisão das partes e encaminhar o projeto para o Poder Legislativo. Quando os pisos foram implantados, há mais de uma década, a conquista dos trabalhadores já era muito importante. Porém, ao longo dos últimos anos, em função da perda de direitos e salários reais da classe trabalhadora brasileira, a conquista dos pisos se tornou ainda mais relevante. Como em Santa Catarina os pisos realmente são praticados, em função da mobilização dos sindicatos, eles evitam que os salários reais sofram quedas muito significativas, como vem ocorrendo nos últimos anos ao nível do país. Os pisos são fundamentais porque, como os salários em regra são muito baixos no país, os pisos garantem uma renda mínima para a classe, inclusive, um pouco acima do salário-mínimo nacional. Além dos pisos serem um impeditivo de os salários caírem ainda mais, sua negociação logo no início do ano serve como referência para as demais negociações, que se sucedem nas datas bases subsequentes. Os pisos são essenciais também para incrementar o mercado consumidor interno, em função da capilaridade e da abrangência que os mesmos possuem. Por ocasião da implantação dos pisos, em 2010, a avalição do DIEESE foi a de que os mesmos melhoraram a renda de cerca de 1 milhão de catarinenses, parcela expressiva da força de trabalho e da própria população. Nas últimas negociações os pisos se tornaram também uma proteção dos trabalhadores em relação aos aumentos abusivos dos alimentos básicos. O salário mínimo necessário, calculado pelo DIEESE atingiu recentemente a marca dos R$ 5.969,17, o que corresponde a 5,42 vezes o piso nacional....A vida dos comerciários parece não ter importância para a classe empresarial de Canoinhas
04/03/2021
Por Fernando José Camargo, Presidente do Sindicato dos Empregados no Comércio de Canoinhas Com um misto de tristeza e revolta, assistimos parte dos representantes da classe lojista de Canoinhas expondo por mais tempo seus trabalhadores, e por consequência seus familiares, aos riscos de infecção pelo coronavírus. Não há escrúpulos, somente a ganância guia alguns empresários. Estarão eles vivendo em Marte? Não sabem o que está acontecendo na região Oeste de Santa Catarina? Dados amplamente divulgados na imprensa e nas redes sociais, por fontes confiáveis, dão conta de que: 524 vidas ceifadas pelo Covid-19 em Santa Catarina até o dia 03/03/2021; 94,4% dos leitos de UTIs estão ocupados em todo o estado; 251 pessoas estão na fila de espera por leito de UTIs; 16 pessoas morreram na fila, à espera de vaga em UTI; 1 morte a cada 25 minutos foi registrada no Brasil na última semana. Em 2020, quando imagens dos mortos por coronavírus na Itália circularam o mundo, houve uma grande comoção social. Naquele período os cientistas já apontavam para a necessidade urgente de restrições da circulação das pessoas para evitar tragédias maiores. Lá, também, alguns governantes, pressionados pelo setor econômico, num primeiro momento preservaram os lucros à custa das vidas. “Ora, eram só vidas de trabalhadores.” “Cientistas! quem liga para eles?” pensamentos como esses colocam vidas em perigo e, por difícil que seja acreditar, há empresários que pensam assim. Infelizmente, chegamos no Brasil a uma tragédia de proporções muito maiores àquela enfrentada pela Itália, ainda que a comoção pareça não ser a mesma. Durante este tempo de um ano, o vírus sofreu mutações e tornou-se mais eficaz para se alastrar e causar mais estragos. Falamos, hoje, em variantes que têm um poder de transmissão pelo menos 50% maior do que os vírus de há um ano. Em Santa Catarina temos atualmente em vigência um decreto do governador que restringe a abertura do comércio nos finais de semana. A diretoria do Sindicato dos Empregados no Comércio de Canoinhas avalia esta medida como excessivamente branda diante do que estamos enfrentando. Defendemos o fechamento total de toda atividade não essencial por 14 dias, como forma de evitarmos o colapso total – não só do sistema de saúde, pois este já enfrentamos – mas de toda a sociedade, com um verdadeiro genocídio ocorrendo nas nossas cidades. Chegamos ao ponto de assistirmos à exportação de doentes! Santa Catarina, o tal “estado de excelência”, não consegue mais atender sua população e pede socorro a outros estados. Infelizmente, veremos trabalhadores Canoinhenses morrerem no Espírito Santo ou em outros estados para onde forem levados. Apela-se para a população para que tenham consciência, se cuidem e não transmitam o vírus. Mas que escolha tem o...26/08/2020
Por José Álvaro de Lima Cardoso, economista e supervisor técnico do DIEESE-SC. Os sindicatos sempre estiveram sob fogo cerrado porque são as principais ferramentas de organização e defesa dos trabalhadores. Os sindicatos atuam ao nível da estrutura econômica, portanto, interferem diretamente nos interesses econômicos dos donos do Dinheiro. Sozinho o trabalhador não tem nenhum poder para enfrentar o capital. O único poder social dos trabalhores é o seu número porque ele se encontra em grande quantidade. Mas esse poder numérico só existe se o trabalhador estiver organizado em sindicato. Os sindicatos aumentaram sua importância porque estamos num momento crucial da história do país. Recentemente o país sofreu um golpe de Estado que fez a fome retornar com força, piorou ainda mais a situação da indústria, o Imperialismo ganhou ainda mais poder, a situação dos trabalhadores entrou numa regressão inédita, o desemprego e a desigualdade explodiram. Entre os golpistas há inúmeras discordâncias: em relação a Bolsonaro, em relação ao enfrentamento da pandemia, etc. Mas eles têm grande unidade em relação ao programa econômico de guerra contra a população, que entrega riquezas ao estrangeiro e destrói direitos trabalhistas e sociais. O golpe de 2016 levou a um retrocesso político e econômico muito grande. O país está nas mãos de uma direita terraplanista completamente lunática, e sob o jugo dos militares. O fato coloca o risco concreto não só de um golpe militar aberto, num eventual agravamento da situação econômica, mas da instalação de um regime fascista. Para o qual, inclusive, o fato do núcleo de poder federal já ser fascista, contribuiu enormemente. Enquanto somos distraídos pelos crimes menores dos golpistas (rachadinhas e outros), o regime vai se movendo à direita, com perdas de direitos, assassinatos de líderes populares, destruição dos sindicatos, e assim por diante. Ao mesmo tempo, em meio a maior crise sanitária dos últimos 100 anos, avançam as chamadas reformas neoliberais, sobre as quais há total unidade da burguesia. Por exemplo, acabaram de aprovar no Congresso o novo marco regulatório de água e saneamento no Brasil, que abre o setor para as empresas privadas. A queda da taxa de sindicalização, entre 2012 e 2018, de 16,1% para 12,5% decorre do imenso fogo cruzado sobre os direitos dos trabalhadores e suas organizações. A crise econômica atual, que é a mais brutal da história, fez disparar o desemprego e a precarização do trabalho, dois inimigos ferozes da sindicalização e dos sindicatos. Mas é o conjunto dos ataques para cima dos trabalhadores que explica uma queda tão expressiva da sindicalização. Por exemplo, a partir de 2016 começou a proliferar empregos por contra própria e sem carteira assinada, segmentos que tradicionalmente não se aproximam dos sindicatos. Ademais, explodiu o número de trabalhadores de...04/05/2020
Por: Cesar Sanson, professor de Sociologia do Trabalho na Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN.* “Mudanças substanciais acontecerão na sociedade do trabalho após o fim da pandemia do coronavírus? Tudo indica que não. As alterações não serão significativas e as que estão em curso favorecerão sobretudo o capital“, afirma Cesar Sanson, professor de Sociologia do Trabalho na Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN. Eis o artigo. A pandemia do coronavírus escancarou que a maioria dos trabalhos imprescindíveis é mal paga. Quanto mais útil o trabalho, pior a sua remuneração. Com exceção de pouquíssimas categorias, como profissionais de saúde, dentre deles os médicos, a grande maioria, dos quais não abrimos mão, recebem salários miseráveis. Mesmo na área da saúde, muito tem se falado dos que ‘estão na linha de frente’ da luta contra o vírus associando-os aos médicos e enfermeiros e esquecendo-se de uma variedade de outros trabalhadores como os porteiros, atendentes, maqueiros, motoristas e auxiliares de limpeza nas unidades de saúde. Esses, que estão expostos como os outros e muitas vezes com equipamentos inferiores, são pouco lembrados e estão na rabeira da cadeia salarial. Quem pode seguir o confinamento rigoroso faz uso dos trabalhadores de aplicativos. Esses se tornaram a manus da porta para fora, para o mundo exterior, para se adquirir as coisas que não podem faltar. Esses que se equilibram em suas motos e bicicletas recebem migalhas. Podemos citar aqui ainda muitas categorias que também estão ‘na linha de frente’ e dos quais não podemos nos privar em tempos de pandemia: trabalhadores de supermercados, farmácias, frentistas, porteiros e vigilantes, motoristas e cobradores de coletivos, coletores de lixo etc. Em comum, todos ganham pouco. Para esses as coisas mudaram para pior. Além da péssima remuneração, estão expostos ao risco de contraírem o vírus. Mas há uma gama infindável de outras categorias, sobretudo os vinculados à indústria da transformação e à área de serviços que foram para a quarentena por não serem atividades consideradas essenciais. Esses passaram a enfrentar além do receio do vírus, o pânico do desemprego. Muitos foram confrontados com mutilações salariais a partir de leis do governo federal que com o intuito de preservar empregos facultaram as empresas a reduzir salários. Outros foram demitidos e outros convocados a retornarem ao trabalho mesmo em crise crescente da pandemia. É isso ou a rua. Falemos dos trabalhadores informais, daqueles sobretudo que vivem nas ruas vendendo os seus produtos. Para esses, a pandemia foi devastadora. A renda que já era pouca minguou, além de serem vistos como transmissores do vírus pelos outros que circulam pelas avenidas com seus carros ou pelas praças públicas. No emprego doméstico, milhares de mulheres dispensadas. Os professores, por sua vez, sobretudo das escolas privadas, passaram para a condição do teletrabalho ou home office. Situação nova a que tiveram que se adaptar velozmente sem qualificação necessária e sob...29/04/2020
Por: Wilson Ramos Filho (Xixo), doutor em direito, integra o Instituto Defesa da Classe Trabalhadora. Não basta explorar os trabalhadores. É necessário humilhá-los, fazer com que se curvem, se ajoelhem para preservar seus empregos. A dimensão simbólica da submissão ultrapassa em muito a tal subordinação jurídica a que aludem os defensores do Direito Capitalista do Trabalho. Não me recordo de ter visto, em quarenta e dois anos de estudos sobre as relações de trabalho no Brasil, imagens tão violentas. E tão reais. O empresariado, desde o golpe de 2016, vinha colocando as manguinhas de fora. Sem reação à altura, sem reação violenta e proporcional em sentido contrário, sem o exercício da legítima defesa, os empresários se esbaldam. E perdem quaisquer pudores que ainda, pelo menos nas aparências, lhes restavam. O gnomo da Havan, o orelhudo do Madero, o boçal do Condor, a perua de roupão rosa em seda, entre outros, não teriam se agrandado se tivesse havido reação – violenta como as agressões dos empresários, nem mais, nem menos, proporcionais – por parte da sociedade. Prevaleceram os bons-modos, todavia. E pela ausência de reação o fascismo se espraiou. Os empresários de Campina Grande, Paraíba, tiveram a gentileza de nos proporcionar as imagens que nos faltavam para visualizar a maneira capitalista de existir em sociedade que eles defendem. Fizeram seus empregados se ajoelhar, uniformizados, em frente às lojas para pedir, mãos postas, a reabertura, assassina, do comércio enquanto o sistema hospitalar paraibano entra em colapso. Expuseram o capitalismo como ele realmente é, sem mediações, sem ocultação ideológica, tida como desnecessária em nossa realidade bolsonara. Quem manda é o Guedes, disse o jaguara. A Globo aplaudiu. O empresariado suspirou reconfortado. Há muitos desempregados. Os que têm emprego e não se ajoelharem estão fora. Os patrões não necessitam mais se esconder sob o transparente manto da subordinação jurídica. É submissão, mesmo. Não está satisfeito peça a conta. A ideologia do Direito do Trabalho se tornou obsoleta, desnecessária, inútil. Da classe trabalhadora foram retirados direitos que no passado recente tornavam opaca a exploração. Excluíram os pobres as políticas públicas, com o teto nas despesas. Acabaram com a expectativa de uma velhice amparada, com a reforma previdenciária. Uma violência depois de outra, para forçar a genuflexão eterna, para que a exploração fosse mesmo desejada pelos famélicos da terra. Milhares de trabalhadores estão infectados pelo vírus, dezenas de milhares morrerão afogados, sem ar, sem alento. Mas não faz importa. Há um exército de reserva ávido pelos postos de trabalho que vagarem. Os verdadeiros vagabundos, os que vivem da exploração do trabalho alheio, ficarão mais ricos. Terão se livrado dos antigos empregados, aqueles inúteis, sem os custos das verbas rescisórias. Abomináveis na grandeza, os reis da...13/09/2019
Por Paulo Kiliass, doutor em economia e membro da carreira de Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental do governo federal. Ao que tudo indica, a estratégia adotada por Paulo Guedes para se impor como chefe absoluto da economia está sendo exitosa. Desde que se cogitou de seu nome para ocupar o comando da área, ainda na campanha do então ex-capitão/deputado federal, aquele que já foi um Chicago boy de segundo escalão busca confirmar seu programa maximalista na implementação do Estado mínimo no Brasil. No início, essa possibilidade não era muito levada a sério. Em primeiro lugar pela subestimação generalizada que se fazia da candidatura de alguém que se propunha a ser o candidato galvanizador das forças da direita, em um contexto em que se apresentavam figuras tidas como mais “sólidas”, a exemplo de Henrique Meirelles ou Geraldo Alckmin. Em segundo lugar, em razão das conhecidas posições de Bolsonaro a respeito da economia ao longo de sua vida de parlamentar – ele sempre se manifestara em um tom meio nacionalista, deixando transparecer uma posição favorável à presença do Estado na economia. No entanto, aquele antigo estereótipo do militar de direita e nacionalista parece não encontrar mais espaço no tabuleiro das ideias e da disputa ideológica em nosso País, inclusive no interior das Forças Armadas. Bolsonaro conseguiu se aproximar de grupos importantes do empresariado tupiniquim e se credenciou a penetrar com força no interior do financismo, principalmente a partir de sua passagem para o segundo turno no pleito de outubro passado. Superministro vai ocupando espaços. O custo dessa empreitada foi o fortalecimento de Paulo Guedes na formatação de seu programa de governo e no espaço da equipe que iniciou o mandato na Esplanada. Ele queria unificar poderes e conseguiu se transformar no superministro que mais concentrou espaço de decisão em nossa História. Como projeto estratégico, fixou-se naquela que chamou de “mãe de todas as reformas” – a previdência social. Teve mérito ao convencer o ex-deputado que havia se posicionado contra todas as tentativas anteriores desse tipo de mudança constitucional. Apesar do voto contrário às propostas levadas a cabo por FHC, Lula, Dilma e Temer, Bolsonaro resolveu encampar a necessidade de apresentar a sua própria medida, agora já na condição de Presidente da República. É bem verdade que a tramitação foi mais complexa do que o imaginado, uma vez que a proposta inicial de Guedes era muito carregada em maldades consideradas “exageradas” por parte dos representantes da própria direita no Congresso Nacional. O Presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, conseguiu o protagonismo de liderar a aprovação de uma proposta bem mais atenuada, contra a orientação do núcleo duro do governo. De toda a forma, a narrativa é de...19/02/2019
O ano começou e o novo governador catarinense, Moisés, defronta-se com o tamanho da crise financeira do estado. Estrangulado pelos pagamentos exorbitantes da dívida pública de Santa Catarina e pelas isenções tributárias entregues aos grandes empresários, o secretário da fazenda, Paulo Eli, declarou guerra às renúncias fiscais. Escancarou o óbvio em entrevista recente: os grandes empresários, além de terem abatimento de em torno R$ 6 bilhões anuais de impostos, sonegam o restante. A cifra dos R$ 6 bilhões de renúncia corresponde a em torno de 25% da receita total corrente do estado, ou seja, uma verba cavalar na veia da taxa de lucro dos grandes empresários que não se reverte em menores preços pra os consumidores. Dividido entre crédito presumido, isenção tributária e redução da base de cálculo, o rol das renúncias aponta que 60% delas são destinadas a três segmentos da economia: agroindustrial, têxtil e importação. São apenas 11.145 empresas beneficiadas, segundo o secretário. Isso em um universo de em torno de 400 mil empresas catarinenses, ou seja, quem ganha são apenas os grandes. Na desfaçatez de supostamente incentivar as empresas a gerarem empregos, estes programas constituem desoneração brutal de tributos para o estado, impedindo o investimento nas áreas sociais e relegando ao povo o drama do péssimo atendimento. Além de serem uma caixa preta – a Secretaria da Fazenda simplesmente nunca divulgou os nomes das empresas beneficiadas e os valores concedidos em incentivo –,não há qualquer relação entre estes programas e a manutenção e geração de empregos. Esta foi uma política criada por Luiz Henrique da Silveira ainda em seu primeiro mandato e administrada por todos os governadores que passaram pela Casa D’Agronômica. Ela patrocinou uma explosão das importações em Santa Catarina, impulsionando a elite política atrelada às chamadas trading companies (empresas comerciais que operam no mercado internacional), às grandes indústrias, às agroindústrias monopolistas e às grandes redes de varejo, como as Lojas Havan. As federações patronais reagiram pressionando o governo. FIESC, Fecomércio e demais entidades querem manter inalterado o regime de isenções, essa farra com o dinheiro público que não se reverte em absolutamente nenhuma redução de preços ou garantia de geração de empregos. “Um governo voltado para a população e não para os empresários ou para a dívida pública, é disso que precisamos.” Do lado do governador Moisés e de seu secretário, também não acreditamos em nenhuma boa intenção. Anunciam a medida pressionados pelo estrangulamento promovido pela dívida pública, esta que consome metade do orçamento anual da União e que enriquece apenas pouquíssimos capitalistas a nível nacional. Também usam desta desculpa para ventilar que podem atrasar salários de servidores, tentando criar uma justificativa para o arrocho que certamente promoverão sobre o funcionalismo público e contra...