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O economista Marcos Mendes, em entrevista para Denise Neumann, do Jornal “Valor Econômico”, afirma que antes da redemocratização brasileira, em 1985, “os pobres simplesmente não tinham vez”. Quem tinha acesso ao Estado brasileiro eram apenas “os grandes grupos econômicos e a classe média alta”.

Com a redemocratização, prossegue o economista, doutor pela USP, “os mais ricos continuaram com canal de acesso ao poder e continuaram obtendo do Estado o que obtinham antes, como crédito subsidiado, proteção comercial às indústrias, perdão às dívidas agrícolas, uma Justiça que favorece quem tem dinheiro para pagar advogado mais caro, regulação fraca, ou seja, uma série de mecanismos favoráveis aos mais ricos”.

Depois, com o surgimento de “políticas pró-pobre”, as quais “se somaram às políticas pró-ricos”, o que houve de diferente foi que “os mais pobres começaram a ter voz”. Além disso, abriu-se “espaço para a pressão dos sindicatos e outras associações, e por meio delas a classe média também teve espaço para demandar mais do Estado”.

A partir de então, afirma Marcos Mendes, o Estado vem distribuindo “para os ricos, para os muito pobres e para a classe média”. Segundo ele, há “uma pressão sobre o Estado para gastar a favor de todo mundo, e regular a favor de todo mundo”. Ou seja, diz ele, “o rico quer bolsa-BNDES, o pobre quer Bolsa Família, a classe média quer universidade de graça e mercado de trabalho protegido”.

Ao contrário daqueles que afirmam que o Bolsa Família é     um mero artifício eleitoral, Marcos Mendes reconhece que os especialistas da área social mostram que ele “é muito mais eficiente que qualquer outro programa social. Com um custo muito menor, ele tira muito mais gente da pobreza, e reduz muito mais o índice de desigualdade”.

Para os ricos, por exemplo, “só o subsídio do BNDES – a diferença entre o que o Tesouro paga para tomar no mercado e o que ele recebe de volta pela taxa subsidiada do BNDES – custa R$ 24 bilhões por ano, que é exatamente o que ele gasta por ano no Bolsa Família”. Além disso, os ricos “abocanharam R$ 570 bilhões de reais” em juros da dívida pública, em 2002, valor que foi reduzido para R$ 230 bilhões em 2013.

Por isso, tem razão Marcos Mendes quando acredita que “os benefícios que vão para a classe média e a classe alta são muito maiores do que o que pinga para os mais pobres”.

A mídia diz que “a economia vai mal e o país está sendo levado para uma fase ruim”. Mas nada diz da “prática já bem documentada” de que “brasileiros ricos ‘remetem’ recursos para o exterior, de onde voltam para aplicação em títulos do governo, pois os ‘investimentos’ estrangeiros têm isenção de impostos”.

São os ricos os consumidores de “jatos particulares, iates, joias, obras de arte e mansões”, os brasileiros endinheirados que “possuem milhares de residências em Miami, apartamentos de luxo em Londres e Paris e gastam numa noite num cassino em Punta del Este o equivalente à folha de pagamento de centenas de assalariados”.

São eles que, com o discurso do combate à corrupção, de defesa da honestidade e do compromisso com o interesse público, de maior capacidade de gestão para aperfeiçoar o desempenho do Estado, querem “aumentar os juros da dívida pública e o superávit primário”, “reduzir salários e os benefícios previdenciários, e flexibilizar os contratos de trabalho”, promover “o aumento do desemprego para pressionar os salários”, “privatizações, aumento nas tarifas públicas e cortes no orçamento das políticas sociais, abrindo espaço para as empresas privadas ampliarem sua presença no setor”.
Este choque recessivo, que é “defendido pela oposição ao governo Dilma, favorece os ricos e enfraquece trabalhadores, pois mais desemprego reduz o poder de barganha na luta por maior salário, enquanto o gradualismo atual das políticas de combate à inflação e ativação econômica mantém forte o poder das classes do trabalho no interminável conflito distributivo”, como mostra Pochmann.

A mídia e os ricos querem esquecer que, “entre 2003 e 2011, ingressou no mercado brasileiro o equivalente a toda a população da Argentina (mais de 40 milhões de pessoas)”, e por isso o mercado interno tem sido o motor da economia. Destaca-se o lado negativo e esconde-se que há mais empregos, os níveis salariais e as políticas sociais melhoraram.

Não é o governo quem deve “escolher reformas”, como propõe Marcos Mendes. São os eleitores que devem escolher entre fortalecer aqueles que vêm obtendo os maiores benefícios, ou buscar inverter as prioridades, com o aumento na redução das desigualdades.

É preciso verificar quem está ganhando e quem está perdendo, quem está pagando mais e quem está recebendo mais, quem pode e deve perder, quem pode e deve ganhar. Alguém deve ceder, e não deve ser aqueles que têm menos. Isso não é ódio de classe.

REFERÊNCIAS:
Jornal Valor Econômico, 11 de julho de 2014, p. A12.
Le Monde Diplomatique Brasil, nº 84, julho de 2014.
João Sicsú.  Dez anos que abalaram o Brasil. E o futuro? São Paulo: Geração Editorial, 2013.
David Cattani e Marcelo Ramos Oliveira. A sociedade justa e seus inimigos. Porto Alegre: Tomo Editorial, 2012.
Marcio Pochmann. Seu país, as eleições e os rumos da economia. http://www.redebrasilatual.com.br/revistas/97/as-eleicoes-e-a-economia-1520.html
acesso em 24.07.2014

Oswaldo Miqueluzzi  – Advogado, licenciado em História com pós-graduação em História Contemporânea. Ex-vice-presidente da ABRAT (Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas) – Região Sul. Assessor jurídico da Federação dos Trabalhadores no Comércio no Estado de Santa Catarina.

Autor: Oswaldo Miqueluzzi

Publicado em 25/07/2014 -

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